28 novembro 2010

Adaptações e Seres do mar

Eu me pergunto qual deve ser a grande dificuldade em se adaptar um livro para o cinema, excetuando, é claro, as diferenças entre as duas linguagens. Refiro-me à questão de roteiro somente, à história em si. Fico curioso para entender o porquê de ótimas histórias serem deliberadamente mutiladas e destruídas em suas versões cinematográficas.

Assisti hoje ao filme Dagon, baseado no conto A sombra de Innsmouth, do Lovecraft. São tantas as alterações (e empobrecimentos) da história feitas pelo diretor que tenho preguiça de listá-las, mas pelo menos duas merecem registro:

1) No conto o narrador chega a Innsmouth sozinho, por curiosidade e interesses científicos. Ele está interessado em aspectos antropológicos e na arquitetura local. No filme há um casal que vai parar em Imboca (Innsmouth) por conta de um acidente de barco. Mais uma vez a necessidade americana de colocar um casal no meio de tudo. Além do que, se o narrador original da história de Lovecraft é um personagem interessante, que consegue fazer com que criemos alguma empatia por ele, e fiquemos angustiados com apuros que é obrigado a passar durante sua noite em Innsmouth, no filme o casal de protagonistas é uma dupla de imbecis completamente desprovidos de qualquer característica interessante. Torci o tempo inteiro para os filhos do mar lançarem-nos o mais rápido possível no poço de Dagon, ou qualquer coisa do tipo.

2) Lovecraft aborda várias vezes no conto o espanto de Robert (o narrador) para com a língua e a forma de falar dos habitantes de Innsmouth. Ele diz várias vezes "tenho certeza de que não é inglês", ao se referir às vozes que ouve pelos corredores e pelas ruas. Acredito que o diretor Stuart Gordon se apegou a essa frase e facilitou o serviço fazendo com que seus Imbocanos (habitantes da Galícia, na realidade) falassem espanhol. Deveria não ter esquecido da outra frase que Robert usa para se referir à linguagem local: "também não parecia em nada com sons humanos". Uma preocupação maior com a língua poderia ter dado um aspecto de maior seriedade ao filme.

Além disso, os habitantes da cidade são muito mal cuidados e foram criados com pouca criatividade. As imagens que podem ser extraídas das descrições de Robert, no livro, abrem espaço para uma miríade de criaturas realmente espantosas para a inteligência humana, o que não acontece em Dagon, a não ser quando é apresentado o personagem Xavier., um ser realmente bizarro. Os habitantes da Imboca de Gordon parecem mais com zumbis que andam pelas ruas se arrastando e gritando palavras em espanhol do que com os seres descritos no conto. Na verdade, levando em consideração esse aspecto, Dagon se assemelha mais com Resident Evil 4 (playstation II) do que com a história sobre Innsmouth.

A força poética da última parte do livro é trabalhada de forma muito pobre na versão cinematográfica, embora seja uma das melhores sequências do filme, mesmo que muito decepcionante, quando se tem em mente o fim original do conto.

Em resumo, mais uma decepção da relação literatura/cinema.

Dagon "tradicional"

Forma do "Dagon" no filme, pelo que se pode imaginar em sua rápida aparição.


P.S.: O personagem principal lembra muito o Jeffrey Combs, cheguei a pensar que poderia se tratar de um filho dele, o que concederia ao filme uma estrela a mais no meu filmow, afinal, colocar um filho do Combs em uma adaptação do Lovecraft seria algo praticamente ritualistico.



17 novembro 2010

Mais futebol

Certo, aconteceu hoje o clássico do futebol sulamericano/mundial: Brasil x Argentina. Os vizinhos venceram por um a zero (Messi), depois de um jogo, a meu ver, beirando o medíocre, em ambos os lados. Tudo bem até aí. Duas seleções mitológicas podem, vez ou outra, mostrar um futebol razoável/ruim, até porque nunca entendi como manter uma "tradição" tão grande em torno de algo tão volátil e instável como uma seleção nacional.

O lance interessante, pelo menos comigo, é o fato de torcer para a Argentina. Não saberia explicar exatamente o porquê disso, mas há dois apontamentos: 1) fico indignado com o patriotismo de copa do mundo, onde todo mundo, de 4 em 4 anos, idolatra a pátria verde amarela, para deixá-la no esquecimento depois, quando não no ódio, se a seleção for eliminada. Além do que, a maioria dessas pessoas, passa os mesmo 4 anos não dando a mínima para futebol. 2) considero o futebol argentino muito mais encantador que o brasileiro atual. Ainda há, por aquelas bandas, sinais de amor pelo que se está fazendo, e não só de estar em um "emprego", que é jogar bola. E não é só em relação à seleção; acho muito mais bonito ver um River x Boca que um Flamengo x Corinthians, por exemplo. Mas a nível de seleção a coisa é muito maior. Juntando o 1º motivo ao encantamento com o futebol deles, e o desencanto pelo lado de cá, é difícil não estar do lado hermano, quando o assunto é futebol.

Só para deixar claro, não sou um anti-seleção brasileira, ou algo do tipo, como alguns torcedores não-argentinos da Argentina. Simplesmente, entre os dois, fico com os camisas celestes.

Um fato que considero curioso é que, quando digo para algumas pessoas que torço para a Argentina, imediatamente surgem a perguntas: "você nasceu lá?", "tem parentes lá?", "Então por que torcer?". Se eu morasse em um lugar onde as pessoas escolhem seus times por apoio regional, em que pertencer à geografia do time é algo importante, entenderia os questionamentos. Agora quando a pergunta vem de alguém que mora no interior do Goiás, de alguém cuja família veio inteira do Ceará, e torce para o Internacional, ou de um brasiliense que nem sabe onde fica o Flamengo, mas torce para o Rubro-Negro, não há como conversar, só achar graça.

No mais, Vitória hoje! Gol do guerreiro-garoto Messi. (E o "menino" Neymar do Galvão Bueno não conseguiu encará-lo, como disse desejar).




16 novembro 2010

Barrilete Cósmico y Orgullo Cordobés

Punk + Rodrigo "El Potro + Futebol + Maradona = Felicidade.

Não tenho palavras para descrever minha animação quando descobri este cover. Conheci a banda Talco quando procurava músicas relacionadas ao clube alemão St. Pauli, então baixei um EP chamado exatamente St. Pauli e deparo-me com um belíssimo ska-punk italiano. Mas o melhor estava por vir: a 3ª faixa, chamada La Mano de Dios. Quando li, pensei "não é possível", mas era verdade. A música é um cover da bela canção do cuartetero argentino Rodrigo "El Potro" Bueno, que narra a história do mitológico Diego Armando Maradona.

Como diria aquele narrador fantástico uruguaio, durante o jogo da Argentina na copa de 86: "gracias dios por el futbol, por Maradona".

Bem, ei-la:


Baixe o EP, ou o cd Mazel Tov, e tenha um dia mais feliz.

11 novembro 2010

Aos cristãos perseguidos

Acabei de assistir a um clipe interessante. Um vídeo de um grupo genérico de música gospel. Nele, ocorre o seguinte: são mostradas várias cenas de pessoas pelo mundo; asiáticos, africanos, etc. Não-cristãos e não-europeus, para ficar claríssimo. Essas pessoas são mostradas trajando roupas ou participando de momentos que denunciam o seu "não-cristianismo". Depois de rodar pelos grupos diversos de pessoas, o vídeo vai retornando a cada um deles, mostrando-os em um momento de sofrimento, enquanto a música diz "você tem um amigo ao seu lado, Ele vive, ele está contigo", e assim por diante (nada clichê, lógico). Depois de mais uma rotação pelos grupos, é a vez de voltar a cada um deles e mostrar o momento de encontro com um "missionário" que os apresenta à fé de Cristo. Não é preciso frequentar um ministério da fé qualquer para imaginar que a próxima cena mostrará as pessoas em um momento de triunfo, naquelas situações de mãos estendidas, e cara de jogador quando faz o gol. Ou então de mãos dadas, balbuciando palavras com lágrimas nos olhos.

Eu penso em porque uma canção-vídeo dessas se preocupa em mostrar a conversão de um aborígene australiano, de um budista vietnamita, ou de um praticante das artes africanas, ao invés da conversão a Jesus de um europeu ateu, ou praticante dos variados neo-paganismos indo-europeus. Tem a ver com cristianizar ou europeizar?

P.S.: O título faz referência à frase que aparece no fim do vídeo: "Servindo cristãos perseguidos". O negrito é deles, não meu. Sim, se você não for cristão, dane-se se for perseguido.

10 novembro 2010

"Teatro Satânico" Português

Vi em um informativo virtual sobre música que Aires Ferreira lançara seu primeiro álbum. Não conhecia o artista, mas fiquei curioso ao ler que se tratava do gênero "spoken word", um estilo que aprecio desde que conheci Boyd Rice. O fato de ser em português aguçou mais ainda minha curiosidade.

Pois bem, o álbum está disponível gratuitamente e não esperei muito para conhecer o trabalho de Aires. Após duas músicas foi impossível não pensar "é um Teatro Satânico português!" E não estou a chamar o trabalho do luso de imitação, mas de algo muito diverso dentro do gênero. A comparação com a dupla italiana fica na enorme variação vocal de Aires. O sujeito é capaz de interpretar vários papéis dentro de um mesmo som, e variar do monólogo comum ao spoken a agoniantes gritos de desespero.

Sem delongas, a quem ler, ouça este "bloco de assofrimentos":
http://www.sanatorioprod.com/AiresFerreiraRuina2010.rar

.22

"As calibre .22 são as preferidas dos profissionais. Tem força para perfurar a caixa craniana, mas não o suficiente para sair, ricocheteando lá dentro e destruindo o cérebro."