23 junho 2010

Como cheguei a pensar o que penso neste exato momento

Saramago morreu. Como não podia deixar de ser, li as notas e artigos que saíram na mídia sobre ele. Não me lembro como, mas cheguei a um artigo em que Harold Bloom chama Saramago de "o maior romancista vivo" e "um dos últimos titãs de um gênero que está para sumir". Não são essas palavras, exatamente, mas é o que ele diz. Foi assim que, hoje, pensei que, se houvesse algum interesse em "salvar" a literatura, por assim dizer, ou algum novo movimento literário que lutasse por algo, um dos objetivos deveria ser salvar o romance.

Isso é possível nos tempos dos blogs e de publicações tão insignificantes que mal são lembradas e citadas pelas bocas dos "leitores" de tudo aquilo que é novo? Esses leitores não tem paciência, tempo e disposição para ler o que é antigo. O romance é algo antigo, velho, é ultrapassado. Não interessa se você consegue ler a saga completa do Crepúsculo ou qualquer outro livreco sobre vampiros, bruxas, cavaleiros, etc. Você não é um leitor de romances e, se o fosse, provavelmente não perderia seu tempo com essas leituras. Então sim, o romance é antigo, velho e ultrapassado para a nossa nova civilização de leitores de filmes-emulados-em-livros-emulados-em-filmes ad infinitum. Imagino que os "autores" dessa safra dos romances pós-romances já escrevam seus livros pensando em qual ator teen seria ideal para seu herói galante, e qual patricinha (ou revoltadinha estilizada) se encaixaria no papel da mocinha.

O futuro do romance, então? Saramago me perdoe pelas palavras mas, só deus sabe!

P.S.: Haverá um documentário sobre a vida e o relacionamento do Saramago e sua esposa, Pilar, com estréia prevista para novembro. Quem apreciava a obra desse simpático senhor deverá achar muito interessante. Aqui o trailer.


4 comentários:

  1. Esse documentário parece ser bem legal. Gosto muito de conhecer aspectos cotidianos de meus autores prediletos.

    "Isso é possível nos tempos dos blogs e de publicações tão insignificantes que mal são lembradas e citadas pelas bocas dos "leitores" de tudo aquilo que é novo? Esses leitores não tem paciência, tempo e disposição para ler o que é antigo." - se cultura é algo que diz respeito à memória, ao acumulo de conhecimentos e feitos significativos do passado e, ao mesmo tempo, esquecimento de conhecimentos e feitos sem significação, pergunto-me como as gerações irão reter/repassar não esses simulacros de literatura com vampiros que brilham no escuro (isso é lixo mesmo, produto para ser consumido e esquecido mesmo), mas tudo aquilo que concebemos como alta cultura (a tradição literária brasileira de nomes como Machado de Assis, Graciliano Ramos, Clarice, Gonçalves Dias, José de Alencar, etc). Afinal a identidade de uma literatura está aí, cimentada nas linhas desses e outros autores, cuja obra formam o nosso cânone. Se até estudantes de Letras acham que José Lins do Rego é "chato" (ouvi isso em corredores de biblioteca e não era em tom de piada), o que dizer então de pessoas que ñ estudam literatura.

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  2. Vou comentar só para deixar o link do blog novo. Depois comento com calma.

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  3. Concordando com o Leandro e nutrindo a raiva que tenho por membros da academia que esmagam tudo com suas palavras e o que importa a eles é somente o diploma para prestar concurso superior...
    Romance é passado e pá. Se tu for leitor de romance hoje em dia, é oldschool. Nego me olha carregando pra cima e pra baixo o Ulisses (que, puta merda, quanta inovação bacana) e já pergunta a "história", se tem filme e se é de aventura. Meus bagos sorriem quando falo que as quase 1000 páginas falam sobre um dia de uma personagem.

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  4. Leandro, li estes dias um artigo do Olavo de Carvalho (sim, nesse ele acertou em algumas coisas) chamado "A origem na burrice nacional" onde ele fala exatamente isso que você disse. Vivemos numa "tradição de esquecimento", que visa criar uma cultura em cima do efêmero, absolutamente renovável a cada instante, de acordo com as necessidades do mercado. O que podemos pensar disso? Só consigo cair num pessimismo e desgosto infinitos.

    D., no mesmo artigo, ele fala desses acadêmicos que preferem tentar humilhar um professor, com seu parco conhecimento maquiado de arrogância, que tentar aprender com ele. A "rebeldia" de hoje não é canalizada contra a figura da autoridade, mas contra qualquer um que, de alguma forma, pareça "melhor" em algo.

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